A existência do escravismo é um fato que ocorre na terra há muito tempo. Várias civilizações basearam-se na produção escravocrata ao longo da história. Esta prática está citada, inclusive, no Antigo Testamento. Por escravo entendemos o individuo que se tornou propriedade de outro, a quem deve prestar serviços gerais, de forma coercitiva, sem remuneração, sem alguma espécie de ganho, excetuando-se a ração básica para sua própria sobrevivência. Considerados objetos, são, por conseguinte, uma forma de mercadoria, passível de ser negociada no mercado pelo seu dono. Tornar-se escravo podia ser o resultado, por exemplo, de derrota em guerras ou mesmo por motivo de dívidas não pagas. O escravo, portanto, é alguém que tem anulado o seu direito a cidadania.
Dentro do período colonial no Brasil, o trabalho escravo foi um item de extrema relevância para o funcionamento agroexportador. Durante o século XVI os indígenas passaram a ser capturados para o trabalho compulsório. São Paulo, vilarejo distante do centro propulsor da economia colonial, utilizou muito a mão de obra indígena até a entrada do século XVIII. Nas localidades mais prósperas, os senhores de engenho consumiam vasta quantidade de negros vindos da África, que eram produto caro. Os portugueses, desde o século XIV, faziam negócios com mercadores de escravos no oeste africano, áreas de Gana, Benin e Níger, aproveitando-se do costume local. Uma prática que prosperou ao longo dos anos, enriquecendo fornecedores e consumidores, incluindo-se aqui também a experiência da colonização holandesa no nordeste.
Somente no século XIX é que efetivamente o trafico negreiro foi atacado pelas autoridades. Na verdade, a Inglaterra, grande potência imperialista do período, realizava sua pioneira revolução industrial, necessitando de consumidores e apregoando o liberalismo. No Velho Mundo, o Iluminismo e os ideais de ‘liberdade, igualdade e fraternidade’, chacoalhavam as bases das antigas monarquias e seus valores. O capitalismo se fortalecia. Mas, ainda assim, o Brasil foi abrir mão desse exercício, oficialmente, somente em 1888, levando inclusive à queda do Império, pois, mesmo independente em 1822, o Estado manteve o escravismo. Aliás, o Papa Leão XIII escreveu à época pedindo apoio dos bispos pela causa da libertação, contra a resistência local. Os efeitos ainda são perceptíveis na desigualdade social existente hoje.
Passados, então, 125 anos da proibição dessa vergonha, ainda é mantido no país o trabalho escravo. O Ministério do Trabalho e Emprego tem uma divisão, exatamente, para fiscalizar e coibir essa chaga. E são dados bastante inquietantes.
Estudo realizado pelo governo apontou que, no ano de 2012, pleno século XXI, 2849 trabalhadores foram recolhidos dessa situação, o que significa um aumento de 14,3% em relação a 2011. O ano de 2012 também superou a marca de 2010, que somou 2628 pessoas resgatadas. De acordo com a fiscalização de combate, a quantidade de resgatados em 2012 revela regularidade nos resultados das ações nos últimos cinco anos. Porem, o próprio governo admite que as condições existentes para esse combate deverão ser alteradas por conta de uma suposta sofisticação do perfil do trabalho escravo, maquiando a modalidade. A Organização Internacional do Trabalho – OIT tem um projeto de ação contra o trabalho escravo no país e destaca que esse tipo de delito acontece em especial na zona rural, onde há jornadas exaustivas e condições degradantes de jornada, junto à questão da ausência da liberdade. Caso dos envolvidos com a produção de carvão vegetal no Pará. E não vamos esquecer que aproximadamente 258 mil crianças e adolescentes entre 10 e 17 anos trabalham na casa de terceiros no país – das quais 94% são do sexo feminino. Não são escravos, contudo, significa também farta exploração.
É profundamente triste vermos a resistência de um crime humanitário assim perseverar. A presença do governo precisa se intensificar de forma incisiva e apurada. Não há saídas através de apelos morais para conter empresários inescrupulosos como esses. São Paulo, 16 de Maio de 2013.
Prof. José de Almeida Amaral Júnior
Professor universitário em Ciências Sociais; Economista, pós-graduado em Sociologia e mestre em Políticas de Educação; Colunista do Jornal Mundo Lusíada On Line, do Jornal Cantareira e da Rádio 9 de Julho AM 1600 Khz de São Paulo.