A Assustadora Demolição Da Nação

A sexta feira foi marcada em todo o País por manifestações populares denominadas “Dia Nacional de Lutas”. Foi organizada por centrais sindicais e movimentos sociais e deu-se na maioria das capitais e no Distrito Federal. Questionaram o processo de privatizações, os cortes nos gastos públicos referentes às políticas sociais e, em especial, destacaram a contrariedade referente às propostas de mudança em torno da reforma da Previdência, que ainda está em tramitação no Congresso Nacional e também contra as novas regras que pretendem mudar a legislação trabalhista.
As novas medidas da reforma trabalhista passaram a valer neste dia 11 de novembro. Sua essência é a flexibilização das leis relativas ao trabalho. Para os movimentos, as mudanças foram feitas para permitir a maior acumulação de lucros por parte do capital. E o discurso constantemente repercutido pela grande mídia comercial é que estas medidas facilitariam a contratação e, por conseguinte, a ampliação do emprego. Medidas, segundo o governo e a imprensa corporativa, que ajudarão a economia do País avançar. Isto porque a CLT – Consolidação das Leis do Trabalho estariam por demais ultrapassadas. O que não é verdade, porque ela vem sendo atualizada ao longo dos anos, desde que foi implantada por Getúlio Vargas há 74 anos.
Para os sindicalistas e os movimentos populares, as modificações da reforma afetam diretamente a vida de todos os trabalhadores de forma muito negativa, significando um verdadeiro retrocesso histórico nas conquistas das classes laborais. É um grande desmonte dos direitos e também um ataque à organização dos sindicatos. Não é possível se ficar assistindo ao ‘conto de fadas’ repetido pelo governo Temer e pela grande mídia porque os efeitos serão perversos para grande parte da população, que já vive com parcos recursos e numa quotidiana ‘corda bamba’.
As pessoas não devem estranhar esta grande relação entre os interesses do atual governo Temer, a classe patronal e a grande mídia, artífices com setores da Justiça do impeachment sobre Dilma. Em verdade, recente pesquisa publicada pela organização Repórteres sem Fronteiras em parceria com o coletivo Intervozes mostra que a maior parte dos grandes grupos de comunicação tem relação direta com outros setores da economia, isto é, entre 26 grupos mapeados no Brasil, nos segmentos de TV, rádio, mídia impressa e internet, 21 deles possuem negócios em áreas como educação, agropecuária, mercado imobiliário, setor financeiro e saúde. Fica claro porque as greves são relatadas como ‘baderna’, ‘desordem’ e também porque a corrupção, tão intensamente propalada durante os governos Lula e Dilma, perdeu o impacto e a repetição temática nos jornais atualmente. Isto ficou evidente quando dos arquivamentos das denúncias escandalosas contra Temer feitas pela PGR, por exemplo, com manifestações bastante tímidas, coincidindo com as ausências de passeatas verde-amarelas e panelaços. Afinal, corrupção não é “coisa de petralha”. Ela é sistêmica, resultado das relações de empresas, portanto do mercado, com agentes do governo. De qualquer governo. Basta querer investigar a fundo para saber e, obviamente, trazer à luz os fatos.
As mudanças, então, mexem em pontos como férias, jornada, remuneração, plano de carreira, regulamentam novas modalidades de trabalho, como o home office (trabalho remoto) e o pagamento por período trabalhado, o tal “trabalho intermitente”. Um dos principais pontos da Reforma abre a possibilidade para que negociações entre trabalhadores e empresas se sobreponham à legislação trabalhista, o chamado “acordado sobre o legislado”. Poderão ser negociados à revelia da CLT o parcelamento de férias, a jornada de trabalho, a redução de salário, a adesão ao seguro desemprego, a prorrogação de jornada em ambiente insalubre e o banco de horas. Assim, por exemplo, o intervalo para alimentação poderá ser de apenas meia hora. Na demissão em comum acordo, a multa do FGTS cairá para 20%, o aviso prévio será de 15 dias e não haverá o direito a receber o seguro-desemprego. A empresa poderá dividir as férias do empregado em até 3 vezes no ano. A jornada 12 x 36 passará a dispensar negociação coletiva para implantação. Gestante poderá exercer função em graus mínimo e médio de insalubridade. Tempo de deslocamento para o trabalho não será mais considerado no pagamento. Legaliza-se a prestação de serviço com subordinação, mas não com forma contínua, alternando períodos de trabalho e inatividade; períodos estes contados por horas, dias ou meses e, a cada 12 meses, o trabalhador tem direito a férias sem remuneração. É o chamado “trabalho intermitente”. Quanto aos danos morais, para pessoas físicas, o juiz fixará indenização de acordo com o salário do ofendido. Se for pessoa jurídica, será pelo salário de quem ofender. A lei cria restrições de acesso ao Judiciário: a gratuidade será concedida apenas ao trabalhador com remuneração igual ou inferior a 40% do teto do Regime Geral da Previdência. Entre outras coisas. Em meio a tal clima adverso, vale lembrar a declaração recente do Presidente do TST – Tribunal Superior do Trabalho, que causou indignação aos sindicatos e à oposição no Congresso. Para Ives Gandra Filho, o trabalhador de baixa renda não deve receber grandes indenizações, mesmo que fique incapacitado ou morra, pois isso seria “dar ao fulano um prêmio de loteria” (Folha, 6/11/2017). Um posicionamento elitista, preconceituoso, que reduz o trabalhador humilde a algo descartável em meio ao processo produtivo. E ele é o presidente do atual TST. Postura que faz coro com o Projeto apresentado no primeiro semestre deste ano, pelos ruralistas no Congresso, também tratando das questões trabalhistas. A intenção era restringir o poder da Justiça do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho e alterar normas para permitir, por exemplo, que o empregador deixasse de pagar salário ao empregado do campo, podendo a remuneração ser feita por “qualquer espécie”, como alimentação e moradia (http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/bancada-ruralista-quer-trocar-salario-de-trabalhador-rural-por-alimento-e-moradia/). A legalização do trabalho escravo, pagar com comida! Sem contar as palavras do guru em economia do candidato à presidência da extrema-direita, Jair Bolsonaro (PSC-RJ), o prof. Adolfo Sachsida, que afirmou há algum tempo o fato de termos poucas mulheres em cargos de chefia e seus salários serem menores é explicado por “não haver muita mulher genial”. Isto é o Brasil hoje. Um país em destruição, cujo governo festeja redução de desemprego através da elevação de trabalho precarizado. Onde a classe média, para atingir o nível de renda de 2014, terá que esperar até 2023, segundo consultorias.
Se a população, os movimentos organizados, não tomarem iniciativas insistentes para barrarem tais fatos promovidos pelos grupos pós-impeachment, o desastre terá consequências ainda muito piores para o futuro, além daquilo que estamos verificando agora nesta demolição da nação pela brutalidade com as camadas populares e o assalto ao patrimônio nacional em benefício do mercado. É simplesmente assustador. São Paulo, 12 de novembro de 2017.

 

Prof. José de Almeida Amaral Júnior
Professor universitário em Ciências Sociais; Economista, pós-graduado em Sociologia e mestre em Políticas de Educação; Colunista do Jornal Mundo Lusíada On Line, do Jornal Cantareira e da Rádio 9 de Julho AM 1600 Khz de São Paulo

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