Da Redação com Lusa
O Presidente da República disse nesta quinta-feira perceber a opinião negativa, “já muito antiga”, dos portugueses relativamente ao funcionamento da Justiça, e recordou que há muito tem insistido junto dos partidos políticos para a urgência de uma reforma.
Marcelo Rebelo de Sousa, que falava à imprensa na cidade italiana de Florença à margem de uma conferência sobre o futuro da União Europeia, comentava os resultados de uma sondagem da Universidade Católica para a Antena 1, RTP e jornal Público, hoje divulgada, segundo a qual mais de 70 por cento dos inquiridos têm uma opinião negativa sobre o estado da Justiça em Portugal.
Lembrando que tem feito vários discursos e intervenções sobre esta matéria e a defender que “a reforma da Justiça é uma questão fundamental”, o chefe de Estado considerou que “os portugueses são muito sensíveis em particular a um aspeto, que é o tempo da Justiça”.
“O tempo da justiça não pode ser o tempo da comunicação social. Não pode. Mas também não pode ser tão lento, tão lento, tão lento que as pessoas morram antes de verem a Justiça concretizada ou ela perca a sua justiça por não ser uma justiça atempada. Portanto, nesse sentido, é evidente que eu percebo esse tipo de opinião, que já é muito antiga”, disse, acrescentando que, “ao longo de décadas”, as sondagens mostram que os portugueses têm “a noção de que o tempo excessivo retira justiça à Justiça”.
Dando “um pequeno exemplo” de “um problema que se arrasta há anos”, Marcelo Rebelo de Sousa falou do caso dos oficiais de justiça, que não o viram o seu estatuto revisto na mesma altura em que foi revisto o estatuto dos juízes e magistrados do Ministério Público, o que, de acordo com juízes com quem o Presidente falou, “pode ter significado um atraso de ano e meio em decisões judiciais, por causa de problemas do estatuto não reconhecido, lutas sindicais, greves”, entre outros.
Questionado sobre se o caso da investigação que levou à demissão do antigo primeiro-ministro António Costa não poderá ter contribuído para a noção em Portugal de que a Justiça funciona mal, o Presidente da República disse que nunca se pronunciou sobre essa matéria concreta nem o fará, e que apenas estava a fazer “um comentário genérico, porque as pessoas têm a noção, na vida delas, de que a Justiça acaba por aparecer muito, muito tarde”.
Já quando questionado sobre se o Presidente da República não pode fazer nada, Marcelo respondeu que tem tentado há anos sensibilizar todas as partes para a necessidade de enfrentar o problema.
“Eu, logo que entrei, em 2016, propus um pacto entre os operadores judiciais, entre os protagonistas da Justiça. Fizeram o pacto e apresentaram o pacto aos políticos. Só uma pequena parte foi aplicada. Depois, continuei a insistir, agora virado mais para os partidos políticos, e agora concretamente para os partidos políticos nesta fase”, disse, recordando que, na tomada de posse do atual Governo, “disse que é uma prioridade fundamental e urgente que o Governo e o Parlamento, no consenso mais amplo que seja possível, encarem o que é preciso mudar na Justiça portuguesa”.
Antonio Costa
O Presidente disse que continua a pensar que António Costa “é um nome consensual” para a presidência do Conselho Europeu, escusando-se a comentar se essa hipotética nomeação pode ser prejudicada pela demora da Justiça portuguesa.
Em declarações à margem de uma conferência na Itália, Marcelo Rebelo de Sousa, ao ser questionado sobre se a falta de desenvolvimentos na investigação denominada operação Influencer, que conduziu em 07 de novembro do ano passado à demissão do antigo primeiro-ministro, pode prejudicar a possibilidade de António Costa assumir um alto cargo europeu, reiterou que tal seria bom para a Europa e para Portugal, mas escusou-se a falar do processo judicial.
“Eu o máximo que posso dizer sobre isso, sem estar a comentar a justiça em Portugal, é que continuo a pensar, cada vez que falo com responsáveis europeus, que o nome do antigo primeiro-ministro António Costa é um nome consensual nas várias famílias europeias, nas mais variadas famílias políticas europeias”, começou por dizer, acrescentando que “era assim há seis ou há sete meses, e continua assim hoje”.
“E, portanto, significa que eu considero que a possibilidade de ele vir a ser presidente do Conselho Europeu é boa para a Europa e também é boa para Portugal. Mais do que isso não posso dizer, pois seria entrar como é evidente, na formulação de juízos sobre a justiça”, disse.
Confrontado com declarações públicas de alguns altos responsáveis políticos europeus que admitiram ser difícil António Costa ser o nome escolhido para presidir ao Conselho Europeu enquanto se mantiver a suspeição, Marcelo Rebelo de Sousa assegurou que essa questão não lhe tem sido mencionada.
“Esse ponto não me disseram. Disseram-me apenas que era realmente uma figura incontestada, pela experiência que tem – era dos mais antigos primeiros-ministros da Europa -, pela aceitação que tinha na sua família, mas também na família do PPE, na família liberal, e até noutras famílias, porque realmente se movia muito à vontade e porque tinha uma capacidade de negociação muito rara em termos europeus. Isso é um facto”, completou.
António Costa demitiu-se do cargo de primeiro-ministro em novembro de 2023, após ter sido divulgado que era alvo de um inquérito instaurado no Ministério Público junto do Supremo Tribunal de Justiça após ter siso extraída uma certidão do processo-crime Operação Influencer.
O caso está relacionado com a produção de energia a partir de hidrogênio em Sines, Setúbal, e com o projeto de construção de um centro de dados (Data Center) na zona industrial e logística de Sines pela Start Campus.
Apesar da demissão, António Costa continua a ser apontado como uma forte possibilidade para a presidência do Conselho Europeu, no quadro das nomeações para os altos cargos institucionais na União Europeia (UE) para a próxima legislatura que terão lugar após as eleições europeias de junho.