Portos: longe da modernização

A levar-se em conta as posições que a diretoria da Agência Nacional dos Transportes Aquaviários (Antaq) tem dado a público, o governo federal não alimenta nenhuma disposição de alterar o decreto nº 6.620, de 2008, que mudou em parte a Lei nº 8.630, de 25/2/1993, a chamada Lei de Modernização dos Portos, a pretexto de estabelecer uma política pública portuária para incentivar novos investimentos em portos públicos, parcerias público-privadas e participação da iniciativa privada nas concorrências e nas operações portuárias.

Como se sabe, aquele decreto, em relação aos terminais de uso privativo (TUPs), passou a estimular a sua implementação, desde que façam parte do processo produtivo ou estejam integrados à cadeia produtiva de determinada empresa. Em outras palavras: a legislação passou a estabelecer que novos terminais do setor privado só seriam concedidos para empreendimentos que procurassem atender , majoritariamente, cargas próprias – na maioria, de empresas exportadoras – e não de terceiros.

Não se questiona os benefícios que o decreto tem trazido, inclusive com incentivos à ampliação dos terminais existentes, em busca de sua modernização e de oferta de novas áreas para licitação em portos públicos. Mas, nos caso específico dos TUPs, a medida restritiva tem atuado como obstáculo aos investimentos que vinham sendo dirigidos à ampliação de antigos e à construção de novos terminais portuários. Basta ver que, desde então, poucas concessões foram feitas, o que tem favorecido o congestionamento de contêineres nos portos brasileiros.

Obviamente, se não fosse essa restrição – que limita (e muito) a perspectiva de retorno ao capital investido –, com certeza, novos investimentos privados poderiam ter sido feitos nos portos brasileiros. E as condições de operacionalidade seriam outras e mais favoráveis. Diante das dificuldades levantadas por essa restrição e também em razão de questões burocráticas, o que se tem visto é que os investidores têm optado por adquirir participação em terminais privados já em operação.

Dessa forma, volta-se ao tempo do Brasil colônia quando a Coroa portuguesa estabelecia que a exploração de determinados ramos de atividade econômica dependia de sua autorização explícita, o que favorecia comerciantes ou pequenos grupos que viviam à sombra do Estado – os chamados estancos (monopólios). É a chamada mentalidade cartorial que obriga o investidor que quiser ingressar no setor portuário a disputar os leilões dos terminais que tiveram ou terão seus contratos de arrendamentos por vencer. É de lembrar que até 2014 só no Porto de Santos, responsável por 32% do comércio exterior brasileiro, vencerão 12 contratos de arrendamento de terminais.

É verdade que as nuvens da economia mundial continuam carregadas e não se sabe quando se dissolverão, mas o País, bem ou mal, tem suportado a crise mundial e seu comércio exterior avançado, ainda que à custa das exportações de commodities, na maior parte, devendo crescer pelo menos 15% em relação a 2010. Portanto, foge à luz da razão que tenha de ficar pelo menos mais dois anos e meio à espera de novos investimentos que possam dar início a um efetivo processo de modernização de sua estrutura portuária. 

Aliás, a modernização só virá mesmo no dia em que não houver distinção entre portos públicos e terminais privativos, com a completa privatização dos portos, ficando o governo apenas com a função de regular o setor por meio da atuação de uma agência. Isso, porém, significa tirar as companhias docas do tabuleiro do jogo político-partidário em que sempre servem de moeda de troca. É por isso que a privatização não sai. E a modernização custa a chegar.

Mauro Lourenço Dias
Vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *