Na terça feira, dia 27 de setembro, biólogos, ecologistas e ambientalistas alertaram a população para o fato de o planeta ter entrado ‘no vermelho’. Isto significa que a humanidade, em menos de nove meses, já consumiu o que a Terra poderia se auto-refazer neste ano. Assim, deste o restante de setembro até o final de 2011, tudo o que for usado de fonte natural não tem retorno, não tem regeneração imediata. Está além da capacidade do sistema. É uma espécie de ‘divida’ que se aprofunda. E uma situação mais que crítica. Não obstante, o ser humano prossegue sua ação sem a devida cautela.
Este assunto, extremamente delicado e paradoxalmente pouco discutido dada sua importância, está baseado num cálculo ambiental chamado de ‘Pegada Ecológica’. A Pegada Ecológica – ou Ecological Footprint (EF) – é uma forma de avaliação proposta em 1996 pelos cientistas Wackernagel & Rees e representa o espaço ambiental necessário para sustentar um determinado sistema. É uma espécie de contabilidade que relaciona a interação do meio com a ação humana. Pensa os fluxos de matéria e energia que transitam em um sistema econômico, fazendo uma correspondência disso em termos de área de terra ou de água existentes na natureza para sustentar essa produção. Assim, todo indivíduo ou grupo está imprimindo no ambiente o seu impacto, sua marca ou, como eles dizem, sua pegada. Calcula-se então o quanto de hectares com agua e terra produtiva é preciso para se manter esse indivíduo ou grupo funcionando, considerando recursos utilizados e lixo produzido.
Segundo Wackernagel, presidente da Global Footprint Network, o consumo global em 1961 requeria apenas 0,63 da capacidade do planeta de se renovar. Em 1975, o número chegou a 0,97. E, logo depois, começou o débito anual. Em 1980 a EF já era de 1,06 planeta; em 2005 chegou a 1,45 e hoje, com o avanço dos padrões de consumo, há exigência de uma área praticamente equivalente a um planeta e meio. A cada ano a humanidade perde três dias. Nesse embalo, quando chegarmos em 2030, serão necessárias duas Terras para suportar a população e seus hábitos de consumo e produção. Este cálculo se baseia em pesquisa sobre 200 países no globo.
Recentemente o teólogo Leonardo Boff escreveu um artigo que discute esta precária situação da saúde do planeta. Ele lembrou-se das preocupações do geoquímico russo W.Vernadsky ainda na década de 1920; do inglês James Lovelock nos anos 1970 e do gaúcho agrônomo José Lutzenberger, que diziam em seus estudos que a Terra é um superorganismo vivo que se autoregula. Gaia é esse ‘organismo mãe’ que gerou os seres humanos, livres e conscientes, para viverem com todas as demais criaturas, interconectados entre si, harmoniosamente. Porém, esse livre arbítrio do ser humano, está levando a uma crise com a natureza, a uma ruptura, cujas seqüelas já podemos sentir pelos quatro cantos do mundo. Efeito estufa, derretimento do gelo polar, furacões, tufões, inundações, queimadas de matas e florestas, poluição do ar, da água e do solo, extinção de espécies da fauna e flora etc. O nível do mar subiu entre 20 e 30 cm no séc. XX. Muitas agressões se sucedem. E Gaia está perdendo a tolerância. Mas, parece que não estamos querendo entender, querendo encarar a realidade. Boff resgata o ponto tocado em 1972 pelo Clube de Roma, composto por cientistas, industriais e políticos, que discutiu os limites do crescimento econômico levando em conta o uso crescente dos recursos naturais. E não mudou nada de lá para cá. Tanto que o relatório do FMI “Perspectivas Econômicas Mundiais” prevê para 2012 um crescimento mundial de 4,3%. Leia-se: mais recursos a serem utilizados para consumo. E com um detalhe: em meio à grande crise financeira escancarada em 2008 que não sossegou até agora, em reunião na Alemanha há poucos dias para se tratar do assunto, apenas um dos 17 prêmios Nobel de economia presentes, J. Stiglitz, apontou que os pressupostos atuais desta ciência precisam ser revistos. Para todos os demais o modelo está correto e apenas necessita de reparos. Não custa aqui lembrar o documento “Estado do Mundo – 2010”, do World Watch Institute, que revelou em 2006 os Estados Unidos sozinhos terem sido responsáveis por 32% do total de tudo que foi consumido no planeta sendo, apenas, 5% da população mundial. Apenas um sexto da humanidade consome 78% de tudo que é produzido no mundo. Uma situação apavorante e, porque não, criminosa. São muitas as evidências.
O que podemos, então, depreender disto tudo? Os nobres e premiados economistas são arautos de um modo de produção problemático, concentrador de riquezas e devastador de Gaia. Representam bem o poder existente e sua postura utilitária e fria. É preciso, portanto, um novo olhar, uma reeducação dos sentidos, uma nova cultura que abrace a natureza nos colocando como parte dela, não pedantemente superiores a ela; um verdadeiro, justo e sustentável modo de produção. E não escapa ninguém: somos todos responsáveis por essa marca no planeta. É fundamental que acordemos logo para a vida antes que ela se canse de nossa atitude ignorante.
Prof. José de Almeida Amaral Júnior
Professor universitário em Ciências Sociais; Economista, pós-graduado em Sociologia e mestre em Políticas de Educação; Colunista do Jornal Mundo Lusíada On Line, do Jornal Cantareira e da Rádio 9 de Julho AM 1600 Khz de São Paulo.
2 comentários em “Consumismo faz adoecer Planeta Terra”
Olá Professor!
É extremamente triste observar que nosso planeta está sendo devastado dessa forma. Triste também constatar que os valores estabelecidos mundo a fora se referem a tudo o que é material.
Praticamente inexiste educação ambiental efetiva e favorecimento de ações em beneficio da saúde do nosso planeta.
O consumo sim tem sido amplamente incentivado pelos que estão no poder, sendo prioridade “ter” a todo custo em detrimento de “ser e fazer”. A população vai assimilando alienadamente necessidades e desejos por todo e qualquer objeto, seja ele o mais inútil.
O ser humano está perdendo a capacidade e sensibilidade de enxergar e valorizar seu semelhante, o que dizer então sobre a natureza… Esta se tornou mais um grande objeto de onde podem extrair tudo o que for oportuno, independente das consequências. Esquecemos que ela é vital e que nós somos seus dependentes.
Que as consciências possam ser acordadas a tempo. E que possa crescer a parcela da população que se interessa e se preocupa realmente com o peso de suas pegadas!
Um abraço,
Rebecca Schelesky!
Graça e paz da parte de Deus !!!
É realmente um asunto muito delicado, inclusive penso que deveria ser tratado com mais relevâcia, mas parece que a midia não se interessa ou tem medo de divulgar, e o povo mais simples que contribui (muitas vezes sem conhecimento)de maneira significativa através do consumismo é privado dessas informações.
Muito boa coluna !!!