Após fogo em Murça, produtores de castanha pedem ajuda para recomeçar

Da Redação com Lusa

Produtores de castanha de Curros, aldeia do concelho de Valpaços, dizem ter perdido uma importante fonte de rendimento para o incêndio que há uma semana lavrou neste território e pedem a ajuda do Governo para recomeçar.

Segunda-feira, 18 de julho, é um dia que os habitantes de Curros não vão esquecer. O fogo começou um dia antes, em Cortinhas, Murça, e alastrou-se para Vila Pouca de Aguiar e, depois, Valpaços.

“Estava a encher uma tina de água, vi as chamas passar por cima da minha casa e tudo o que fosse por baixo queimava. Nunca pensei ver uma coisa assim”, contou Ernesto Eira, 69 anos.

Uma semana depois, a reportagem encontrou três produtores de castanha de volta de um rio sem água, na entrada da aldeia de Curros, inserida na zona da serra da Padrela, onde se situa a maior mancha de castanha judia da Europa, o fruto que é a principal fonte de rendimento para muitas famílias desta região do distrito de Vila Real.

“Arderam-me à vontade 1.000 a 1.100 castanheiros dos cerca de 1.500 que tenho. Alguns já adultos, com 30 anos. Este ano nem vou chamar mulheres para a apanha porque não há castanha. Em Curros não há castanha”, afirmou Ernesto Eira.

O produtor está aposentado, mas a castanha era “uma importante ajuda” no rendimento familiar. No ano passado colheu cerca de 9.000 euros e “não foi muito”, porque o “ano também correu mal”.

Este ano, apesar da seca que se sente, os castanheiros “estavam bonitos”, os “ouriços granditos” e agora, segundo o agricultor, já não é possível recuperar as árvores que ficaram queimadas.

Orlando Ribeiro, 52 anos, estava em Vila Real quando recebeu uma chamada a avisar do incêndio em Curros. No regresso não conseguiu passar para a aldeia, localizada no fundo de um monte.

“Arderam-me talvez mais de 300 castanheiros e ardeu-me o carro de trabalho, que estava estacionado à beira de casa. Quando cheguei a casa já estava o estrago todo feito”, referiu.

Uma semana depois ainda não conseguiu ir ao souto. Tem espreitado da estrada. “Vejo que está tudo queimado. Praticamente vivo da castanha”, frisou.

O terreno estava lavrado, com um mato baldio ao lado e as árvores, descreveu, “ficaram sem folhas verdes, nenhumas”. No ano passado este produtor colheu cerca de 8.000 quilos de castanha.

Nuno Lopes, 38 anos, contabiliza uma perda de cerca de “600 a 700 castanheiros” com este fogo que passou por várias aldeias dos três concelhos.

No ano passado fez cerca de 12.500 euros com a produção de castanha e, este ano, calcula que “vai ser zero”. “Este ano não vou faturar naturalmente. Fiquei com 20 ou 30 castanheiros, pequeninos, com um ano ou dois”, apontou.

Bastou, recordou, cerca de meia hora para ficar “tudo queimado”. Ao calor juntou-se o vento forte que empurrou o fogo e “já não houve tempo para nada”.

“Não pudemos fazer mais nada a não ser acudir às casas, mais nada (…) E se estivessem aqui 100 ou 200 bombeiros ardia igual, não havia tempo. Foi muito rápido”, referiu Nuno Lopes.

Este produtor disse que, em Curros, “só não arderam as árvores à beira do rio”.

“Se o Estado não nos der uma ajuda para plantação eu não planto mais nenhum castanheiro e aquilo que eu sinto dos meus colegas é o mesmo. Todos eles me dizem que se não houver uma ajuda do Estado para isto, a malta não vai plantar”, afirmou Ernesto Eira.

Os produtores apontam dificuldades relacionadas com o aumento dos custos de produção, desde as máquinas, os combustíveis, os adubos até às próprias plantas.

“Sem ajudas não vai ser fácil repor o que ardeu porque é muita quantidade”, salientou Orlando Ribeiro.

Nuno Lopes ainda tem um viveiro com alguns castanheiros que vai aproveitar para repor, mas frisou que, sem isso, não o faria.

Também este produtor disse que é preciso uma ajuda, “pelo menos para a plantação”.

Esta é, explicaram os produtores, “uma árvore que se demora a fazer” e a “dar rendimento”.

“Andamos seis, sete, oito anos a trabalhar para eles (castanheiros) e a partir daí é que eles começam a dar um rendimento para nós”, frisou Orlando Ribeiro.

Técnico da Associação Agricultores para Valorizar o Futuro (Agrifuturo), Jorge Espírito Santo já percorreu parte da área ardida e disse à Lusa que o “impacto é chocante”.

“A maior área que ardeu é de pinhal, mas temos muitas culturas atingidas, nomeadamente a nível dos soutos, o olival, o amendoal, a vinha, ainda culturas temporárias que dariam alimentação ao gado existente na zona e não podemos esquecer, também, a parte da apicultura”, afirmou.

Jorge Espírito Santos afirmou que a castanha é “sustento para muita gente”, lembrando que “cerca de 80% das pessoas desta região vivem” desta cultura.

“Vai ser um ano muito complicado em termos de produção (…) Há castanheiros que ficaram completamente dizimados e há outros em que os produtores estão a fazer tratamento para ainda salvar a planta”, frisou o responsável.

Na serra da Padrela, a produção de castanha ronda as 12.000 toneladas por ano.

O presidente da Câmara de Murça já pediu apoios ao Governo para responder aos graves prejuízos causados pelo incêndio que devastou parte do município e falou mesmo “numa situação de calamidade”.

Esta autarquia apontou, numa avaliação preliminar, para uma área ardida a rondar os 10.000 hectares nos três concelhos atingidos.

No terreno está a ser feito o levantamento dos prejuízos causados pelo incêndio que ficou resolvido na quinta-feira.

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