Da Redação com Lusa
Um grupo de pesquisadores em ecologia e paleoecologia de várias universidades publicou hoje um artigo em que questiona o povoamento viking dos Açores prévio à chegada dos portugueses ao arquipélago, como tinha sido avançado num estudo em outubro.
Na revista científica PNAS, o grupo, liderado por Rui Bento Elias (da Universidade dos Açores), argumenta que “não existem evidências suficientes para concluir que o proposto povoamento Viking tenha causado ampla perturbação da ecologia e da paisagem nos Açores, antes da chegada dos portugueses”, refere-se numa nota de imprensa enviada à Lusa.
“Com base nas informações disponíveis, não negando a possibilidade de presença humana anterior, argumentamos que não existem evidências sólidas que suportem a existência de alterações antropogénicas de larga escala, causadas por povoadores pré-portugueses”, referem os especialistas das Universidades dos Açores, Austrália, Lisboa, Munique e Madeira.
O artigo reavalia o hipotético povoamento Viking do arquipélago dos Açores antes da chegada dos portugueses – particularmente a ideia de impactes ecológicos proposta pelo estudo internacional divulgado em outubro.
Aquela investigação, que contou com a participação de investigadores do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos – Açores (CIBIO), detetou presença humana nos Açores 700 anos antes da chegada dos portugueses.
Também publicada na revista PNAS, a investigação conclui que as primeiras evidências de presença humana nas ilhas foram detetadas 700 antes da chegada dos portugueses no século XV, nomeadamente à ilha de Santa Maria em 1427 e às ilhas do Corvo e das Flores em 1452.
Agora, grupo de investigadores liderado por Elias propõe “uma interpretação diferente para os dados apresentados” pelos autores do estudo, “apresentando explicações alternativas a um hipotético povoamento anterior à chegada dos portugueses”.
“Esta análise e reinterpretação é apoiada em estudos realizados nas ilhas das Flores e do Pico, que não mostram qualquer evidência de povoamentos anteriores”, bem como “nas numerosas descrições históricas de florestas intocadas em várias ilhas do arquipélago, aquando da chegada dos portugueses”, refere-se na nota de imprensa.
Por outro lado, os investigadores apontam a “ausência de evidências arqueológicas de ocupação humana generalizada anterior ao povoamento empreendido pelo Reino de Portugal”.
Considerando ter sido dado “um importante contributo para entender as mudanças ambientais nos Açores” pelo estudo divulgado em outubro, os investigadores sustentam que “as evidências apresentadas não são suficientes para provar que humanos modificaram os ecossistemas dos Açores antes do povoamento português”.
Na nota de imprensa, refere-se que um “dos principais argumentos utilizados no estudo de Raposeiro e colaboradores, é a presença de carvão nos sedimentos, que seria um sinal da queima de madeira e consequente desflorestação em torno destas lagoas”.
“Se o carvão tivesse origem na queima das florestas pelos hipotéticos povoamentos anteriores à chegada dos portugueses, a presença de carvão seria acompanhada pela diminuição da abundância do pólen das espécies arbóreas. No entanto, na Lagoa do Caldeirão do Corvo, foi detetado carvão desde o séc. IX, com maior frequência entre o 1000 e 1300 EC [Era Comum], mas a percentagem de pólen de espécies arbóreas só apresenta uma diminuição de forma substancial e definitiva, no período português”, referem.
Para os especialistas, “o facto da presença de carvão não ser, de uma forma consistente, acompanhada por uma diminuição clara do coberto arbóreo impede a utilização deste indicador de forma fiável”.
Quanto às mudanças na vegetação, sublinham que “poderão ter origem natural, devido à ocorrência de erupções vulcânicas, fortes tempestades ou deslizamentos de terras”.
“No que respeita aos marcadores fecais da presença de gado e de populações humanas, também são encontrados […] nas fezes de aves”, alertam.