Valpaços recupera método ancestral e produz vinho num lagar rupestre

 

Da Redação com Lusa

Em Valpaços, o concelho com mais lagares rupestres identificados em Portugal, foi produzido um vinho numa destas estruturas escavadas na rocha, com a pisa a pé das uvas e que recupera um método ancestral de vinificação.

São cerca de 120 os lagares escavados na rocha que são conhecidos no concelho de Valpaços, no distrito de Vila Real, alguns remontando ao período romano.

O “Calcatorium” é primeiro vinho de lagar rupestre certificado e rotulado em Portugal e foi apresentado esta sexta-feira, em Santa Valha, localidade onde foi produzido na vindima de 2018.

“O nosso objetivo é colocar Valpaços no mapa da enologia, da cultura e do turismo”, afirmou Augusto Lage, da Associação de Vitivinicultores Transmontanos (AVITRA).

Com esta produção, pretende-se recuperar um processo “único e ancestral” de vinificação que, desde 2020, foi oficialmente reconhecida como método tradicional trasmontano.

Estes vinhos assumem a designação de “vinho de lagar rupestre”, cabendo à Comissão Vitivinícola Regional de Trás-os-Montes (CVRTM) as funções de controlo da produção e do comércio, de promoção, defesa e certificação dos vinhos da região.

O vinho foi vinificado num lagar escavado na rocha da aldeia de Santa Valha.

As uvas foram colhidas numa vinha muito velha, com castas autóctones, brancas e tintas, a lagarada ocorreu no lagar rupestre e, depois, o estágio dos vinhos foi feito em pipas “muito usadas” de carvalho de madeira, na adega do produtor local Nuno Miguel Neves.

Foram engarrafadas 260 garrafas de “Calcatorium” tinto e outras tantas de rosé. Todas elas estão numeradas e a primeira vai ser oferecida ao Presidente da República. O calcatorium é o local onde são colocadas e pisadas as uvas.

“Nós hoje fizemos história, quer para a região quer especificamente para os vinhos de Trás-os-Montes”, afirmou Ana Alves, enóloga da CVRTM.

Com este vinho, acrescentou, pretende-se “promover os lagares, a história e a ancestralidade da região transmontana”.

“Esperamos, agora, que os produtores agarrem nesta possibilidade e que façam muitos mais vinhos de lagar rupestre na região de Trás-os-Montes”, afirmou, acrescentando que vários viticultores já se mostraram interessados em avançar com a produção deste tipo de vinho.

O propósito foi, segundo Ana Alves, fazer o lançamento do vinho, motivar os viticultores para aproveitaram a “ancestralidade e identidade da região” e fazerem um produto “de referência” para Trás-os-Montes.

Quanto ao lagar, o arqueólogo Pedro Pereira, explicou que o que foi usado para a produção do vinho é, a nível técnico, “um mais interessante, porque ainda tem as zonas de estabelecimento de uma prensa mecânica lateralmente e uma série de veios escavados na rocha com outros intuitos para além da produção, como o escoamento de água”.

O responsável explicou, no local, que as datações destes lagares “são relativas” e de acordo com os materiais que são encontrados em torno dos lagares.

“Neste caso há material romano próximo, há um castro romanizado aqui próximo também, há uma larga ocupação deste espaço pelo menos até à alta Idade Média. Aqui podemos dizer que será certamente medieval e com algum grau de certeza podemos dizer que poderá ter sido romano, de instalação inicial”, salientou.

Em Valpaços há muitos lagares identificados, de sete tipologias diferentes, mas, segundo o arqueólogo “há muitos concelhos em que nem sequer estão inventariados”.

Em 2018, foi criada a Associação Portuguesa de Lagares Rupestres (LAROUP) para incentivar “tanto o estudo como a proteção” deste patrimônio, estando previsto o arranque de uma inventariação nacional para breve.

Augusto Lage defendeu ser necessário classificar os lagares rupestres, primeiro a nível municipal e, depois, nacional, de forma a proteger e preservar este patrimônio. O objetivo último, frisou, é a sua classificação como Patrimônio Mundial da Humanidade, uma candidatura que está a ser trabalhada em conjunto com a Galiza (Espanha).

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