Da Redação com Lusa
O ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, disse hoje que o modelo definido na Europa para o certificado digital que permite viagens na região será aplicado a países terceiros, respondendo às preocupações da União Africana (UA).
“O passo seguinte [face ao regulamento que entrará em vigor a 1 de julho] é utilizar os princípios deste modelo para as negociações com países terceiros no que diz respeito ao reconhecimento recíproco de vacinações”, respondeu o governante à Lusa, quando questionado sobre as preocupações da UA por a vacina produzida na Índia sob licença da AstraZeneca, a mais usada em África, ter ficado de fora do certificado digital.
Santos Silva falava durante a conferência de imprensa que encerrou a 11ª reunião ministerial entre a União Europeia e Cabo Verde, esta tarde em Lisboa, que foi promovida pela presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE). No encontro, em formato híbrido, o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros representou o alto representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Josep Borrell.
“O certificado digital é um regulamento da União Europeia, com aplicação direta na UE e regras que se destinam a facilitar a circulação interna no Espaço Schengen, e a vacina é uma das três condições possibilitantes dessa facilitação à circulação, juntamente com a imunização ou teste negativo”, explicou o governante português.
Segundo Santos Silva, “relativamente à vacinação, o que está previsto é a vacinação completa, com uma ou duas doses, consoante o caso, realizada pelo menos 14 dias antes da viagem e de uma das vacinas aprovadas pela Agência Europeia do Medicamento”.
“O passo seguinte é utilizar os princípios deste modelo para as negociações com países terceiros no que diz respeito ao reconhecimento recíproco de vacinações, e é isso que a Comissão Europeia já está a fazer, designadamente com os Estados Unidos e a Suíça, e é isso que faremos com outros países”, apontou o governante, quando questionado sobre o fato de a vacina Covishield, produzida na Índia sob licença da AstraZeneca, ficar de fora deste processo.
Portugal, concluiu, “aplicará escrupulosamente o certificado digital no quadro da circulação interna da UE e utilizará os princípios desse certificado no reconhecimento recíproco de vacinações com países terceiros”.
A Comissão da União Africana e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (África CDC) da organização mostraram-se preocupados com a aplicabilidade do certificado digital da União Europeia, temendo a não inclusão das vacinas inoculadas em África.
Num comunicado partilhado no portal do África CDC na segunda-feira, os dois organismos dizem que “registraram com preocupação as recentes comunicações sobre a aplicabilidade do certificado digital da EU [União Europeia]” perante as diferentes vacinas contra a covid-19.
No documento, saúdam o certificado e “o seu potencial para facilitar significativamente a livre circulação segura em todos os Estados-membros da UE e em certos países associados”, que apelidam de “um passo significativo”.
“Contudo, as atuais diretrizes de aplicabilidade põem em risco o tratamento equitativo das pessoas que receberam as suas vacinas em países que beneficiam do mecanismo Covax, apoiado pela UE, incluindo a maioria dos Estados-membros da UA [União Africana]”, alertaram os dois órgãos regionais.
Na quinta-feira, Portugal aprovou o decreto-lei que regulamenta o certificado digital covid-19 da UE, comprovativo da testagem negativa, vacinação ou recuperação da doença, que entrará em vigor nos 27 Estados-membros a tempo do verão e que poderá ser usado para viagens.
O passaporte contempla apenas as vacinas aprovadas pela EMA (Agência Europeia de Medicamentos): Pfizer/BioNTech, Moderna, AstraZeneca e Janssen.
Citando documentos da Comissão Europeia, as organizações regionais africanas argumentam que a vacina Covishield, produzida pelo Serum Institute of India (SII), maior fabricante de vacinas do mundo, com a licença da AstraZeneca, está excluída deste certificado digital.
“Estes desenvolvimentos são preocupantes, dado que a vacina Covishield tem sido a espinha dorsal das contribuições da Covax, apoiada pela UE para os programas de vacinação dos Estados-membros da UA. Além disso, dado que o objetivo expresso para a produção do Serum Institute of India é servir a Índia e países de menores rendimentos, o SII pode não solicitar uma autorização de comercialização a nível da UE, o que significa desigualdades no acesso aos ‘passes verdes’ criados”, alertaram.
Nesse sentido, a Comissão da UA e o África CDC instaram a Comissão da UE a “considerar o aumento do acesso” no caso da vacinação realizada com recurso às vacinas “consideradas adequadas para o lançamento global através do mecanismo Covax”.
A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos, 3.925.816 mortos no mundo, resultantes de mais de 181 milhões de casos de infeção, segundo um balanço feito pela agência noticiosa francesa AFP.
De acordo com os dados mais recentes do África CDC, o continente totaliza mais de 5,39 milhões de casos de covid-19 desde o início da pandemia, ultrapassando as 140.000 mortes.
Também luso-brasileiros que tomaram a vacina chinesa Coronavac não podem entrar em Portugal com o certificado e vacinação, uma vez que ainda não está aprovada pelo bloco, apesar de ter tido o aval da Organização Mundial da Saúde