Arquivo: Terezinha Alves e Júlio Pereira, programa “Longe dos Olhos Perto do Coração”, Rádio 9 de Julho, em maio/1964
Por Thais Matarazzo
Para Mundo Lusíada
Quinta-feira, 27 de janeiro de 2022. O sol castiga a cidade com tamanho calor. Recebo um recado pelo Whatsapp do padre Armenio Rodrigues, do programa “Caravela do Fado” (Rádio 9 de Julho). Ele me informa sobre o falecimento da fadista Terezinha Alves.
Rapidamente entrei nas redes sociais para saber mais detalhes. Soube, então, que ela havia nos deixado um dia antes. Fiquei muito triste!
Tenho profundo carinho, admiração e gratidão à Teresinha, pois quando comecei a pesquisar sobre as memórias do fado e seus artistas no Brasil, ela foi a pessoa que mais me auxiliou com informações e materiais de pesquisa. Tive a oportunidade de consultar seu rico acervo de fotografias e discos.
Foi ela quem me apresentou a outros artistas. Quando tinha qualquer dúvida sobre o tema, ligava para a Terezinha e prontamente me atendia. Que memória fabulosa!
Estive várias vezes em seu apartamento nas Perdizes. Sempre fui recebida com muito carinho pela fadista e seu marido, José Luiz Marcondes. Terezinha estava sempre arrumada, cabelo arranjado, era vaidosa. Ficávamos horas conversando e ouvindo fados. Ela cantarolava e fazia comentários sobre as gravações. Contava histórias engraçadíssimas acontecidas em shows e no restaurante Adega Lisboa Antiga, do qual foi coproprietária e atração artística. No final, servia um delicioso cafezinho com bolo.
Os fadistas Adélia Pedrosa e Sebastião Manuel estavam sempre em suas conversas. Foram amigos do peito!
Eu estudava em uma universidade na Barra Funda, próxima ao apartamento da Terezinha na Av. Francisco Matarazzo. Uma vez telefonei para avisar que deixaria uns cds na portaria do seu prédio. Ela me disse que não, eu precisava subir nem que fosse cinco minutinhos, ela precisava me mostrar algo que tinha encontrado: um caderno de autógrafos. Foi presente de um amigo. Terezinha, em uma das viagens que fez a Portugal, conseguiu as dedicatórias de dois dos seus artistas portugueses preferidos, Amália Rodrigues e Raul Solnado. Ela tinha muito orgulho daquele caderninho e confessou que nunca mais pegou outros autógrafos. Guardava-o como um tesouro!
Quando iniciou sua carreira artística, no final da década de 1950, com a ajuda dos fadistas e radialistas, Manoel Monteiro e Irene Coelho, conheceu muitos artistas portugueses da velha guarda, e teve contato com a nova geração. Essa fase intermediária fez com que Terezinha se tornasse um elo entre o passado e o futuro.
Lembro-me que no seu acervo fotográfico guardava centenas de fotografias de carreira, de colegas (todas autografadas), do restaurante Adega Lisboa Antiga, das suas atuações e visitas às Casas de Fado em Lisboa – ao lado de grandes personalidades… Precisei de muito tempo para assimilar tamanho volume de informações.
Uma curiosidade é que ela também apreciava a música popular brasileira, sendo fã de Elizeth Cardoso e Nelson Gonçalves. Terezinha gravou um compacto com dois sambas nos anos 1960. Um deles é “Portuguesa no Samba”, escrito especialmente para a fadista. A gravação é ótima.
Por volta de 2011, percebi que Terezinha tinha alguns lapsos de memória quando conversávamos, ela comentou comigo que achava estar com mal de Alzheimer. Respondi que não, deveria ser algo pontual. Infelizmente, ela tinha razão. Em seguida, recebeu o diagnóstico médico.
Foi bem no período em que tive a chance de lançar meu primeiro livro, a biografia da Irene Coelho, madrinha artística de Terezinha Alves.
A artista estando impossibilitada de se apresentar, retirou-se.
Pude homenageá-la através da literatura em três obras de minha autoria: “O Fado no Brasil” (2013), “O Fado nas noite paulistanas” e “O Fado que cantei e outras canções”, ambos de 2015.
Depois, voltei a revê-la em outras duas ou três ocasiões. Uma delas ocorreu em meados de 2014, no Clube Português, quando Adélia Pedrosa, Humberto Fernandes e Bomfim apresentaram-se no projeto “Domingo no Clube”. Terezinha foi prestigiar a amiga-irmã, acompanhada pelo seu dedicado esposo.
Terezinha partiu no dia 26 de janeiro, aos 83 anos. O sepultamento ocorreu no Cemitério do Tremembé, em São Paulo.
Deixará saudades para os familiares, amigos e fãs.
Seu nome está marcado em nossos corações e memórias, na história do Fado e nos registros discográficos que nos legou.
Por Thais Matarazzo
Escritora e autora de “O Fado nas Noites Paulistanas…” (2015), Editora Matarazzo
2 comentários em “Fadista Terezinha Alves (1938 – 2022)”
Thais Matarazzo, seu texto traz uma riqueza de detalhes e informações, uma infinita experiência de viver, relacionar-se e experimentar o Fado. Um relato cheio de emoções. Parabéns!
Estive com a fadista Terezinha Alves na dega Lisboa antiga de presente ela me deu uma foto e autógrafo na hora… tenho até hj