Da Redação
Com Lusa
A curiosidade de um fotojornalista e uma criança de 3 anos estão na origem de um novo instrumento musical da Beira Baixa, o cavaquinho da Beira ou “beiroinha”, que já obteve o registro de marca nacional.
Em outubro de 2016, a Câmara de Idanha-a-Nova e a Filarmônica Idanhense lançaram um curso de construção de viola beiroa, que se iniciou no dia 01 de outubro, Dia Mundial da Música, sendo que o objetivo passava por aprender a construir uma viola beiroa e contribuir para a revitalização da história musical daquele concelho, onde este instrumento musical já teve dias melhores.
A curiosidade levou o fotojornalista António José a inscrever-se no curso, que durou seis meses, e que foi frequentado por 12 formandos.
“Eu não percebia nada nem de viola beiroa nem sequer sabia da sua existência ou tão pouco tinha pegado numa. Fui para lá [Idanha-a-Nova] por curiosidade. A área de trabalhos manuais sempre me fascinou”, confessa António José.
Quando o curso iniciou e os formandos começaram a dar os primeiros passos, fazendo os moldes de base para a construção da viola beiroa, uma criança de 3 anos, filho do responsável da Filarmônica Idanhense, pegou num dos moldes do instrumento musical e andava pela oficina a brincar, “fazendo de conta” que estava a tocar o instrumento.
António José achou piada ao miúdo e decidiu fazer uma miniatura da viola beiroa e oferecê-la à criança, sem pensar, sequer, que estava prestes a dar vida a um novo instrumento musical.
“Depois de construída, outro formando pediu-me para fazer mais uma miniatura para oferecer ao seu neto. Quando fiz a segunda, comecei a pensar em fazer uma coisa a sério. A partir daí, fiz vários modelos, cada vez maiores e quando cheguei ao 12º protótipo, verifiquei que o som era excelente”, conta.
A partir daqui, aquilo que começou por ser uma brincadeira, tornou-se numa questão séria. O curso da viola beiroa terminou e António José montou uma oficina na sua residência, em São Vicente da Beira, no concelho de Castelo Branco.
Começou então a construir as “beiroinhas” e a fazer a divulgação deste instrumento musical que tem quatro ordens de cordas, todas em aço, e que é feito com diversos tipos de madeira, desde o abeto alemão, a nogueira, cerejeira, tília e ébano.
“Toda a gente que tem experimentado este instrumento realça a qualidade do seu som, que é mais harmonioso e envolvente do que o som do cavaquinho tradicional. Trata-se de um instrumento para o povo, com uma construção rústica e vocacionado para o utilizador comum”, explica.
Em janeiro deste ano, António José decidiu avançar com o registo deste novo instrumento musical no Instituto Nacional de Propriedade Industrial, sendo que o despacho favorável deste organismo chegou no início de junho, data a partir da qual o cavaquinho da Beira ou “beiroinha” passou a ser considerado marca nacional e desenho/modelo nacional.
Neste momento, já existem 53 “beiroinhas” espalhadas pelo país, desde a região norte até ao Alentejo e o Grupo de Cavaquinhos de Penha Garcia, em Idanha-a-Nova, está equipado com este novo instrumento.
“O ideal seria que os grupos de cavaquinho existentes na região adotassem este instrumento que é genuinamente beirão. Como se trata de um produto artesanal é mais caro do que o cavaquinho”, afirma o fotojornalista.
António José explica que a construção da “beiroinha” tem como referência o modelo que está exposto no Museu Nacional de Etnologia e que pertenceu a Manuel Moreira, natural de Penha Garcia e considerado o último tocador de viola beiroa.
“Demoro em média quatro dias a fazer uma beiroinha. A decoração varia entre o bordado original da viola beiroa do Manuel Moreira, o bordado de Castelo Branco, a rosa albardeira, uma flor originária da freguesia de Toulões (Idanha-a-Nova) ou a margarida (da Aldeia de Santa Margarida em Idanha-a-Nova). Há também outras decorações a pedido do próprio proprietário”, disse.
O fotojornalista criou também várias ferramentas de apoio para a manufaturação da “beiroinha”.
A Câmara de Idanha-a-Nova já manifestou o desejo de apoiar e de desenvolver este projeto, sendo que a ideia passa pela criação de um centro de interpretação/oficina da viola beiroa e da “beiroinha”.
“Houve um especial carinho deste município, que é Cidade Criativa da Música pela UNESCO, para o meu projeto”, conclui.