Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
À medida que o ser humano se vai desenvolvendo, nos contextos ontogenético e filogenético, revelam-se possibilidades acrescidas de atingir níveis de realização pessoal, que nenhum outro animal jamais o conseguiu, verificando-se que o processo evolutivo não estagnou, mas, pelo contrário, o ritmo de realizações, para o bem e para o mal, tem aumentado de forma nunca antes inigualável.
A pessoa humana procura superar-se a si mesma, e aos seus semelhantes, buscando a sua própria transcendência, até aos limites possíveis da virtude e da perfeição, e/ou dos vícios e da monstruosidade.
O objetivo, materializado numa vida-boa, é compaginável com a superação e erradicação dos pensamentos, e atos prejudiciais aos valores, princípios e boas-práticas, que conduzem ao mais nobre e desejado desígnio humano: a felicidade individual, no contexto de uma sociedade justa, significando aqui a justiça: harmonia, compreensão, solidariedade, igualdade de oportunidades, entreajuda, paz para todos; o bem-estar e a bem-aventurança de cada um e de todos.
Através dos valores que definem a dignidade humana, como a autoridade, o respeito, a obediência, a tolerância, a espiritualidade, existem grandes hipóteses de cada um se libertar de preconceitos contrários àqueles valores e, consequentemente, viver uma vida-boa, mas também se devem aperfeiçoar outras dimensões que conduzem à superioridade racional, ética e organizativa da pessoa e da sociedade.
Torna-se pertinente desenvolver as qualidades, competências e conhecimentos, acima do que se consideraria normal, isto é, superando-se e transcendendo-se até se atingirem objetivos sublimes e, racionalmente, compreensíveis, utilizando-se aqui o conceito segundo o qual: «Transcender é substituir progressivamente os valores materiais pelos valores espirituais. As pessoas normalmente buscam a transcendência pelas trilhas religiosas. Porém, é possível alcançar o mesmo objetivo por meio do desejo consciente de evoluir aprimorando as emoções e cultivando as virtudes, ou seja, através de uma busca racional da espiritualidade.» (PIRES, 1999:42).
A superação de preconceitos, estigmas, rótulos, fobias e situações degradantes, em ordem à transcendência, deverá iniciar-se aquando da implementação do processo de socialização de cada indivíduo, precisamente no quadro das instituições sociais mais significativas e compatíveis com a pessoa humana: família, escola, Igreja, comunicação social, entidades patronais, grupos diversos, e outros parceiros que participam na construção da personalidade do indivíduo e da sociedade.
O processo que conduz à transcendência é: complexo, exigente, mas também, estimulante; implica, determinação, autoridade e responsabilidade; pressupõe, liberdade, criatividade e autonomia; inicia-se, ou deveria começar, no seio da família, e na mais tenra idade.
Nesta perspectiva, compete aos pais e encarregados de educação exercerem a sua influência, impondo uma autoridade democrática, partilhando princípios, deveres, direitos, sentimentos e emoções, conhecimentos, experiências e assumindo responsabilidades.
Deve ser no seio da família que se inicia o projeto para uma vida-boa, no respeito pelas obrigações e benefícios de cada membro, em que o exercício da autoridade seja recíproco, porque: «A autoridade familiar nasce e deve existir como serviço, um instrumento insubstituível de que devem dispor os filhos para crescerem progressivamente a uma mais completa maturidade pessoal, de modo que também os pais se possam realizar como pessoas a nível da família. (…) A autoridade não é um privilégio, mas um dever de consciência, não é um último recurso, mas um clima permanente que sempre se deve respeitar e proteger, mesmo quando não se encontrar em exercício. (…) A autoridade familiar não se move no plano do jurisdicismo, mas deve considerar-se como um serviço, como possibilidade de ser útil, não como meio de dobrar a vontade ou de sujeitar a liberdade das crianças» (ALVES, 1991:51-2).
Sabedoria para gerir, conciliar e potencializar todo este conjunto de variáveis, é uma capacidade exclusivamente humana, que pode proporcionar uma vida-boa, entendida como sucesso em todas as iniciativas e circunstâncias em que se envolver a pessoa, na medida em que: «O sucesso está subordinado à felicidade e, a felicidade, está muito mais próxima da sabedoria do que da inteligência. As melhores coisas da vida brotam de fontes tão pequenas que, muitas vezes, passamos ao lado delas sem percebê-las.» (PIRES, 1999:122).
O preconceito sobre a alegada inutilidade das coisas simples, porém, eficazes, deverá, todavia, ser superado como tantos outros que infestam algumas mentalidades pseudo-técnico-científicas, e também elitistas. É necessária uma autoridade desdogmatizada para se construir o futuro de sucesso que uma vida-boa pode proporcionar.
O investimento a realizar pelos governantes, empresários, instituições religiosas, de solidariedade e comunidades, para proporcionar à esmagadora maioria da população mundial, melhores condições de vida, não serão tão avultados como aqueles que se utilizam na preparação e manutenção de guerras, independentemente dos objetivos a alcançar.
Bibliografia
ALVES, A. Martins, (1991). Autoridade Educativa na Família, Porto: Editorial Perpétuo Socorro.
GRIBBIN, John, (1999). Génesis. As Origens do Homem e do Universo. 2ª Ed. Tradução, Raul Sousa Machado. Mem Martins: Publicações Europa América.
PIRES, Wanderley Ribeiro, (1999). Dos Reflexos à Reflexão. A Grande Transformação no Relacionamento Humano, Campinas: Editora Komedi.
Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Professor Universitário, Escritor, Mestre em Filosofia Moderna e Contemporânea.
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