Neste final de semana tivemos a primeira etapa das eleições 2010. Por todo o Brasil o povo pode se manifestar e escolher seus representantes para os cargos de executivo federal e estadual, senador e deputados. E, como resultado geral, vamos ter 2º turno para presidente da república, além das disputas para governos do Distrito Federal – Wesliam Roriz (PSC) e Agnelo Queiroz (PT), Amapá – Pedro Paulo (PP) e Jorge Amanajas (PSDB) e Goiás – Marconi Perillo (PSDB) e Iris Rezende (PMDB). Mas, certamente, a batalha que mais chamará a atenção será mesmo aquela envolvendo Dilma, PT versus José Serra, PSDB/DEM.
Não dá para se afirmar que o resultado tenha sido imprevisível. Afinal, a maioria dos institutos de pesquisa se posicionava colocando a possibilidade da vitória em 1º turno exatamente sobre a margem de erro estatístico. Ou seja, a chance de haver um segundo tempo era parte provável do jogo. E, o mais interessante: o 2º turno ocorreu exatamente porque houve um crescimento da candidatura de Marina Silva, do PV, que arrancou votos de Dilma e também dos indecisos. Por pouco a governista não levou. E com um congresso que pode lhe ser favorável, se vencer a próxima fase. Serra se manteve em sua habitual média de 33%. Não fosse pela candidata do PV, domingo tinha encerrado o pleito para a presidência.
Assim, como não poderia deixar de ser, ao longo desta semana, o grande assunto no campo político foi exatamente ‘quem são os eleitores de Marina’ e ‘como ela se comportará na segunda fase’, uma vez que ambos os partidos que irão disputar desejam seu apoio.
No geral, podemos perceber que a história da ‘onda verde’ é relativa. Não é possível afirmar que houve um crescimento do pensamento ecologista/ ambientalista. Dos 11 candidatos do PV para executivo estadual pelo país afora eles conseguiram apenas 4,2% de todos os votos válidos. Foram 3,5 milhões de votos, isto é, menos de 20% do que Marina obteve. O PV, ao menos por enquanto, é um partido pouco expressivo. Um coadjuvante. Precisa trabalhar para aproveitar a situação. Ou seja, dá a aparência que foi um voto não no projeto político partidário, mas sim na candidata.
Marina é ex-ministra de Lula. Nascida e criada em um seringal no Acre. Perdeu a mãe e irmãos, sofreu de várias doenças tropicais e se alfabetizou na adolescência. Foi militante do PT ao lado de Chico Mendes. Foi deputada estadual e depois senadora. Saiu do partido por não ter sido convidada a pilotar o Programa Amazônia Sustentável e divergir das ações desenvolvimentistas governamentais. Depois de desejar ser freira converteu-se e se tornou evangélica da Assembléia de Deus.
Com a candidatura travada de Serra e o intenso ataque da mídia contra Dilma, envolvendo-a desde as questões dos vazamentos na Receita Federal até o caso de sua assessoria fazendo tráfego de influências, também ajudou a canalizar votos à ex-senadora do Acre as questões sobre aborto, união homossexual e a militância na juventude de Dilma. Aqui, é bom frisar, houve intensa ação também das redes sociais, como e-mails e orkuts, onde se manifestou uma série de acusações de baixo nível que o PT demorou a tomar providências para contornar e desmentir tantas bobagens. Custou caro, com risco de mais desgaste nesta segunda fase. E, aliás, a carga já foi reiniciada. Nesta quarta feira em nota oficial a CNBB, via Comissão Brasileira de Justiça e Paz (CBJP), manifestou preocupação com a ação de muitos grupos que, em nome da fé cristã, "têm criado dificuldades para o voto livre e consciente". "Esses grupos continuaram, inclusive, usando o nome da CNBB, induzindo erroneamente os fiéis a acreditarem que ela tivesse imposto veto a candidatos nestas eleições.” É lamentável esse baixo nível. Calúnia, difamação, hipocrisia e nada de projetos.
Contudo, resta saber agora o que fará Marina e seus 20 milhões de votos? Seu eleitorado conservador aceitará seu posicionamento ao lado de Dilma? Não se sentirão traídos? Ela ficaria confortável ao lado de Serra, um velho adversário, nada religioso ou ecológico, pelo menos até ontem? Não será uma marca de grande incoerência? E, mais ainda, sabendo-se que o PV não teve um desempenho destacado, será que ela, de fato, conseguiria transferir os votos de seu eleitorado? Ou se manterá neutra e liberará seus simpatizantes?
A se conferir, duas coisas: primeiro, tanto PT quanto PSDB precisam aprender a lidar melhor com esse eleitorado que se manifestou e estava oculto nas pesquisas na maior parte do tempo: evangélicos e ambientalistas. Segundo: na história, estatisticamente o eleitorado tende a manter seus votos no 1º turno. Assim, Serra terá que captar entre brancos, nulos e eleitores de Marina um elevadíssimo percentual, inclusive, derrubando a sua alta rejeição, conforme levantado pelos institutos de pesquisa. Dilma só perde com um tsunami. Por isso, atenção, abram os guarda-chuvas: a imprensa conservadora e os marketeiros das redes sociais vão agitar o período. Vai chover mais lama.
São Paulo, 8 de outubro de 2010