25 Abril: Revolução foi ponto de viragem para Portugal na ONU

Foto ONU/Manuel Elias

Da Redação com Lusa

A revolução do 25 de Abril foi ponto de partida para uma mudança na imagem de Portugal na ONU, que ajudou a pôr termo à sua má reputação devido à questão colonial.

As relações entre Portugal e a organização sempre foram tensas desde a sua admissão tardia como Estado-membro, em finais de 1955, devido ao colonialismo, que viria a ser a principal razão das críticas e das condenações aprovadas nos anos seguintes.

Antes do 25 de Abril de 1974, a imagem de Portugal na ONU, sobretudo na Assembleia-Geral, estava longe de ser positiva, conforme disse à Lusa Aurora Almada e Santos, investigadora do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa.

Portugal recusou-se a reconhecer o papel que a ONU pretendia desempenhar na supervisão da forma como as potências coloniais administravam os territórios colonizados.

As relações entre o país e a Organização agravaram-se a partir de 1961 com o início da guerra em Angola, seguida da Guiné e de Moçambique, em 1963 e 1964, respetivamente.

Desde então, Portugal começou a ser alvo de frequentes resoluções aprovadas no Conselho de Segurança e na Assembleia-Geral da ONU, observou Luís Nuno Rodrigues, professor catedrático do Departamento de História do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.

A título de exemplo, o professor destacou uma resolução do Conselho de Segurança, de 1970, considerando o colonialismo português em África uma séria ameaça à paz e à segurança dos estados africanos independentes e a resolução 3061 de 1973 que, com 93 votos favoráveis, reconheceu a independência unilateral da Guiné-Bissau.

Alianças e críticas

A campanha contra a política colonial portuguesa na ONU era liderada pelos países africanos, asiáticos e socialistas.

Estes países, explicou Aurora Almada e Santos, formaram uma aliança informal na ONU contra Portugal e procuravam arregimentar votos entre outros grupos, nomeadamente os latino-americanos.

O impacto negativo desses movimentos contra Portugal, contudo, foi eventualmente atenuado pela abstenção de alguns dos seus principais aliados ocidentais, notou Luís Nuno Rodrigues, frisando que isso se deveu, em grande medida, pelo contexto da Guerra Fria e pelo facto de Portugal fazer parte da chamada esfera de influência norte-americana – o bloco ocidental -, que se opunha ao bloco liderado pela União Soviética.

“Ou seja, Portugal mantinha não só acordos bilaterais com os Estados Unidos que permitiam aos americanos manter a sua base militar nos Açores, como tinha também sido convidado a beneficiar do Plano Marshall e a ser membro fundador na NATO”, explicou o professor.

Além dos EUA, Portugal, como membro fundador da NATO, contava com o apoio de outros países ocidentais que detinham poder de veto no Conselho de Segurança, como o Reino Unido e França, mas também de antigas potências coloniais, como Bélgica, Holanda e Itália, e aqueles com os quais tinha afinidades, com Espanha e Brasil.

Ao longo do tempo, Portugal empregou diversas estratégias para defender a sua política colonial na ONU.

Segundo Aurora Almada e Santos, essas estratégias passaram por tentativas para impedir que a situação nas suas colônias fosse inscrita na ordem do dia, pelo abandono das sessões em que a sua política colonial era debatida, pela integração de pessoas naturais das colônias nas suas delegações, pelo financiamento da participação de organizações e pessoas africanas e goesas em reuniões na ONU ou ainda pelo recurso à diplomacia de bastidores, através de contactos com funcionários do Secretariado e missões de países aliados, como os EUA.

Em relação aos argumentos, Portugal procurou alegar desde o início, ainda durante a década de 1950, que o país não era responsável por territórios não-autônomos, ou seja, não tinha colônias, uma vez que pela revisão constitucional de 1951 esses territórios tinham sido juridicamente transformados em províncias ultramarinas, indicou Luís Nuno Rodrigues.

Outro dos argumentos mais utilizados por Portugal era o recurso à retórica do “luso-tropicalismo”, transmitindo a ideia de que a colonização portuguesa teria sido diferente de todas as outras e, de acordo com o discurso do regime da altura, mais benévola e benéfica para os povos colonizados.

Virada

A viragem nas relações entre Portugal e a ONU não aconteceu logo após o 25 de Abril, segundo os dois especialistas consultados pela Lusa.

A indefinição que se gerou após a revolução levou as Nações Unidas a manter a sua pressão diplomática e, ao longo de maio, junho e julho de 1974, fizeram um conjunto de pronunciamentos apelando a Portugal para que reconhecesse o direito das colônias à autodeterminação e à independência e iniciasse negociações com os movimentos de libertação para a transferência dos poderes.

Um dos momentos marcantes na viragem da percepção da ONU em relação a Portugal aconteceu com a adoção, em 26 de julho, da lei 7/74, que reconheceu o direito das colônias à autodeterminação e no seguimento da qual o então secretário-geral Kurt Waldheim fez uma visita a Portugal.

“Essa visita foi seguida de outros momentos igualmente importantes como o discurso de Francisco Costa Gomes na Assembleia Geral em outubro de 1974 ou a reunião do Comité de Descolonização da ONU em Lisboa em junho de 1975”, apontou a investigadora Aurora Almada e Santos.

Nesse seu discurso, observou Luís Nuno Rodrigues, Costa Gomes reafirmou perante a comunidade internacional o propósito de Portugal em proceder à descolonização de uma forma irreversível e definitiva.

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