Isaura Correia Santos: uma alentejana de alegrete

Por Humberto Pinho da Silva
Em Março de 1914, em plena planície alentejana, nascia a escritora Isaura Correia Santos.
Muito jovem, casou-se com o pintor Abel Santos. Tinha dezessete anos. Era uma menina bonita, moderna e muito determinada.
Publicou trinta e três obras, entre livros e opúsculos. Notável conferencista, trabalhou em Londres, como jornalista da BBC.
O governador do Texas, concedeu-lhe, em reconhecimento da atividade como jornalista e cronista, de grande mérito, o título de cidadã honorária do Estado do Texas.
Suas crónicas apareceram na “ República”, “ O Comércio do Porto”, “ O Primeiro de Janeiro” e em numerosos periódicos locais. Eram, em norma, incisivas e mordazes, todavia nada irreverentes.
Aos sábados, reunia em sua casa, na Praça da Galiza, no Porto, pequena tertúlia. Abordava-se, então, temas: políticos, económicos e mormente literários.
À hora do “ chá”, a Filó – a empregada – colocava sobre a alva toalha adamascada, chávenas de fina porcelana, todas diferentes, mas de grande beleza.
Lembro-me que uma das assíduas frequentadoras, era Dora Correia da Silva, da “ Crónica Feminina”, e o poeta, muito espirituoso e excelente conversador, Jorge Condeixa.
Tinha, a escritora, em Soutelinho, casa de férias, onde, de longe a longe, repousava. No pino do Verão, ia a banhos, para o Estoril.
Certa vez, ao entrar no carro, que estava estacionado na estrada Povoa – Vila do Conde, foi colhida por viatura, e teve que ser hospitalizada, gravemente ferida.
Fui visita-la à Ordem da Trindade. Certa ocasião, ao entardecer, confidenciou-me: “ Os olhos agora começam a ver melhor o interior, a compreender a Vida e seus segredos…” E prosseguiu, em voz dolente: “ Apesar da pouca fé que tenho, confio Nele, e espero na Sua misericórdia.”
E mais adiante:
“ Tenho rezado muito. Este acidente fez-me compreender o que nunca tinha conseguido alcançar.” – E concluiu: – “Não se esqueça de mim, nas suas orações.”
Já convalescente, numa visita que lhe fiz a sua casa, revelou-me que andava preocupadíssima com a saúde da Filó (Filomena).
Telefonou-me uma tarde de Julho, de 1988, muito aflita, dizendo-me que a Filó havia falecido e que se sentia muito só e muito triste.
A escritora, que recebeu o prémio “ Maria Amália Vaz de Carvalho”, era autora da conhecidíssima coleção de livros para crianças: “ O Senhor Sabe Tudo Contou…”
Pouco depois do telefonema, foi internada no Hospital do Carmo. Confessou, durante o internamento, a amiga: “ Não receio morrer – até desejo, – visto acreditar numa outra Vida e principalmente na misericórdia de Deus.”
Em fresca, mas luminosa manhã de Fevereiro, do ano de 1989, fui visitar Frei Martinho Manta, aos Padres Franciscanos, na Rua dos Bragas.
Ao entrar na salinha de visitas, este, de rosto contornado disse-me:
– Morreu uma grande Senhora do meu Alentejo: a escritora Isaura Correia Santos.
Cumpria-se a “profecia” da Filó, proferida dias antes de morrer: “ A minha senhora não vai durar mais de seis meses, após a minha morte!”.

 

Por Humberto Pinho da Silva
De Portugal

Deixe uma resposta

%d blogueiros gostam disto: