Tribunal alerta para “forte alarme social” e “energia criminosa” do jovem detido por ataques no Brasil

Mundo Lusíada com Lusa

Nesta sexta-feira, o tribunal salientou o “forte alarme social” dos crimes imputados ao jovem de 17 anos detido no norte de Portugal por ligações a ataques no Brasil, bem como a sua “energia criminosa”, para aplicar a prisão preventiva.

Segundo o despacho do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) de Lisboa, a que a Lusa teve acesso, o jovem português, cuja detenção foi anunciada na quinta-feira pela Polícia Judiciária (PJ), está indiciado por 11 crimes: um de homicídio qualificado, cinco tentativas de homicídio, dois de pornografia de menores, um de associação criminosa, um de instigação pública a um crime e um de apologia pública de um crime.

A juíza de instrução Carina Realista Santos considerou que os crimes em causa “são geradores de forte alarme social, plenamente justificável, atenta a sua especial gravidade, (…) configurando uma plena perturbação da ordem e tranquilidade pública”.

“É absolutamente notório o perigo concreto de continuação da atividade criminosa, quer pela reiteração dos fatos, quer pela expressiva gravidade dos mesmos, quer, ainda, pela personalidade evidenciada pelo arguido na magnitude da brutalidade e da violência”, refere o despacho judicial, que sublinha ainda a “total indiferença e desprezo” do jovem pelos crimes.

Para o tribunal, o jovem português, de 17 anos, denota “ideias extremistas e radicais muito enraizadas” e exerce um “evidente ascendente” sobre os outros membros do grupo na plataforma Discord, pelo que entendeu estar em causa o perigo de perturbação do inquérito para a aquisição de prova, “já que certamente todos obedeceriam a comandos de silêncio por parte do arguido se contactados”.

No grupo desta plataforma, de acordo com as informações avançadas pela PJ na quinta-feira, eram disseminados conteúdos sobre automutilação grave de jovens, mutilação e morte de animais, propaganda extremista nazi, instigação e prática da “missão” de cometer massacres em escolas e, ainda, partilha e venda de pornografia infantil.

“A natureza dos crimes em causa, a gravidade, a intensidade e extensão dos factos em apreço, a energia criminosa revelada, a previsibilidade de chegado a julgamento ser o arguido condenado em pena efetiva de privação da sua liberdade, impõem a aplicação de uma medida de coação privativa de liberdade”, pode ler-se ainda no despacho.

A magistrada justificou ainda que não poderia aplicar a medida de prisão domiciliária, porque era através da Internet que o jovem praticaria os crimes pelos quais foi indiciado e o acesso a essa tecnologia seria facilitado na permanência na habitação.

A investigação deste caso nasceu no final do ano passado e foi levada a cabo pela Unidade Nacional de Contraterrorismo da Polícia Judiciária (PJ) e esteve a cargo do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, contando ainda com a colaboração da Polícia Federal do Brasil.

“Em momento oportuno, a polícia portuguesa compartilhará os resultados da investigação com a Polícia Federal, a fim de dar continuidade às apurações no Brasil. A investigação seguirá adiante, com uma das principais linhas de investigação sendo a identificação, em âmbito internacional, de outros envolvidos nos crimes” informa também a polícia brasileira.

Travou outros crimes

A detenção do menor de 17 anos por suspeitas de criminalidade violenta e ligação a ataques no Brasil travou a existência de outros crimes, assegurou hoje o diretor nacional da PJ.

Em declarações aos jornalistas, Luís Neves deu mais esclarecimentos sobre a operação anunciada pela PJ na quinta-feira, que decorreu em articulação com as autoridades brasileiras, e sublinhou que o detido é o “único português que está neste momento identificado”, destacando a “capacidade de liderança” para instigar através da Internet outros jovens a cometerem crimes, sobretudo no Brasil, onde foi associado ao ataque numa escola de Sapopemba.

“Estancámos uma atividade que ia ter mais mortos, mais jovens, mais escolas atacadas, mais crimes de massa, mais sofrimento humano. É um trabalho de repressão, mas também um trabalho preventivo global”, referiu, salientando os “atos bárbaros” e de cariz extremista que eram difundidos no grupo da plataforma de Internet em que este jovem operava.

Segundo Luís Neves, o fenômeno de incentivo à criminalidade violenta através das redes sociais e da Internet é algo que “preocupa sobremaneira” a PJ, pelo que a investigação vai continuar.

“Estamos já a contactar com a Europol, porque temos a sensação que há outros comportamentos de idêntica tipologia. Vai ser um trabalho de desmultiplicar a investigação. Estamos a trabalhar em contrarrelógio. Há mais suspeitos, mas não em território nacional. Não temos nenhum indício que permita apontar nesse sentido”, disse.

Sobre o jovem, que foi hoje presente a juiz para o primeiro interrogatório no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), o diretor da PJ realçou o perfil de mentor para aquela comunidade online, considerando que “tinha uma capacidade de liderança enorme para fazer movimentar outros jovens de idênticas idades, sobretudo brasileiros, no sentido de radicalizar outros, de se automutilarem, de cometerem crimes”.

Luís Neves assumiu que chegar à identificação do jovem foi como “encontrar uma agulha num palheiro”, descrevendo um trabalho “moroso e de filigrana” desde o final do ano passado, quando os factos foram comunicados à PJ. Nesse sentido, alertou para as famílias terem “uma maior atenção” aos jovens e para os riscos do seu isolamento social, apresentando um exemplo de um outro crime que estaria em preparação.

“Um dos crimes que estava a ser programada no Brasil era um homicídio com laivos de demorado sofrimento de um mendigo, em que essas imagens iam ser transmitidas no ambiente cibernético e em que cada assistente pagaria uma determinada quantia. Estamos a falar de um conjunto de crimes que foi inviabilizado”, referiu.

Segundo a PJ, na sequência destes comportamentos “veio a decorrer o ataque com arma de fogo (um revólver calibre 38) numa escola de Sapopemba, no Brasil, resultando na morte de uma jovem” de 17 anos.

O autor material do crime na escola brasileira mostrou, no grupo no Discord, imagens da arma e do gorro que iria utilizar, bem como da escola onde o crime iria ocorrer, pode ler-se na nota.

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